“Um humano olhar ao ser que aí está...”



“Um humano olhar ao ser que aí está...”

Luiz Valentin Marcon

“Há uma voz que dança, a uma voz que gira, bailando no ar (Raul Seixas)”, a uma voz que nos envolve, que não se cala, que não ouvimos, há uma voz subterrânea, encarcerada, uma voz silenciosa, que parece não existir. Olhamos para o mundo, andamos no mundo, imaginamos caminhos, superamos abismos, pegamos atalhos, nos enganamos com placas bem sinalizadas, entramos em becos, voltamos, recuamos, encontramos um desvio, e novamente imaginamos que estamos no caminho certo, depois cansamos (ou casamos), armamos acampamento, ocupamos um espaço físico-social, ganhamos e perdemos tempo, envelhecemos, reproduzimos valores, revolucionamos comportamentos, engessamos tradições, ficamos na história de nossas solidões, de nossos filhos, deixamos marcas, sangue, lágrimas, amores, idéias, e morremos. Tudo bem, é assim mesmo.
Quando andamos por aí sem rumo, se é que nos permitimos a tal prazer, escuta-se aquele silêncio interno tão difícil de ouvir, o confundimos com a respiração, batimentos cardíacos, gazes, ranger de ossos e dentes, estalar de beijos, roçar de corpos, dores, desejo, vazio, prazer, e lá no fundo, aquelas perguntas: “De onde eu vim? Para onde vou? Quem sou eu?”, e tudo sem resposta. Alguns “possuem” Deus, energia, espírito, anjo da guarda, coisas do mal, santos, xamãs, coisas do bem, sempre buscando uma resposta, outros “tem” lógica, consciência, ideologia, ídolos, sempre buscando uma resposta, depois morremos, e ... Tudo bem, é assim mesmo.
Outros, com rumo mais certo (?!), trabalham muito, ganham dinheiro, constroem palácios, viajam, tem dores de cabeça, medo de falir, contas movimentadas, ricos adornos, fetiches, exploram-se, se divertem, se cansam, tornam-se cardíacos, depois acumulam mais dinheiro, gastam, começam a morrer, possuem atendimento, plano privado de previdência, depois morrem, e... tudo bem, é assim mesmo.
Também há os visionários, alienista, sonhadores, entusiastas, idealistas, quixotescos, aventureiros, radicais, contempladores, ociosos, poetas, aqueles que parecem estar fora deste tempo, da normalidade vigente, aqueles que invejamos pela tranqüilidade, mas que não compactuamos porque parecem não ter iniciativa, estes também se vão, e... tudo bem, é assim mesmo.
Há! Não podemos esquecer os cientistas com suas metodologias em prol da verdade, os filósofos de intrincada lógica lingüística que também trilham os caminhos da verdade, os céticos que nada se perguntam por ter como verdade a sua impossibilidade, os literatos do cotidiano com suas cotidianas verdades, os apaixonados pela vida que transformam sua vida na verdade absoluta, e os marginalizados que não tem direito à verdade, e ... estes também se vão, mas tudo bem, é assim mesmo.
Quão frágil é o ser humano, e exatamente por sê-lo, tão especial é o ser humano, caminha neste universo misteriosamente maravilhoso, único, singular, esbarra em suas limitações, mas dá continuidade, geração pós-geração a esta insondável existência, a esta singular possibilidade de contribuir, de estar em relação, de criar, produzir, amar, pensando, fazendo-se, amando outra vez, amargurando-se entre circunstâncias, fragmentando-se, observando, perseguindo a felicidade, sendo artista de si mesmo, usando máscaras para suportar as tragédias, amando novamente, talvez agora um filho, um momento do passado, um animal, mas sempre e necessariamente sendo humano. E depois... todos vocês já sabem... sem resposta... é assim mesmo, mas agora já podemos olhar com outros olhos o ser que aí está.

Bons Livros pra se Viver

  • Antologia Poética, Caslos Drummond de Andrade
  • As Três Irmâs, Tchekhov,
  • Cartas a Théo - Vincent Van Gogh
  • Como Quem Risca a Pedra, Paulo Sá Brito
  • Eu e Outras Poesias - Augusto dos Anjos
  • Moll Flanders, Daniel Defoe
  • O Macaco Nu, Desmond Morris
  • O Mundo Como Vontade de Representação, Arthur Schopenhauer
  • O Retrato de Dorian Gray, Oscar Wilde
  • O Sofrimento do Jovem Werther - Johann Wolfgang Goethe
  • Pequeno Mundo, Hermann Hesse
  • Tocaia Grande, Jorge Amado
  • Zen e a Arte da Manutenção de Motocicletas - Pirsig Robert M.

Além do ponto...

Terra do Nunca, Imaginariun, Brazil
Um ser comum, eventualmente comunicável, geralmente distante, pensando...